segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Sobre os caminhos


“Que vês ali, depois daquele muro, meu jovem?”. “Não vejo nada! O muro é alto demais”. “E por isso vais ficar aí, parado?”. “Como assim?”. “Só porque o muro é alto e porque, daqui, você não é capaz e ver o que há depois, vais ficar assim, parado, inerte, passivo?”. “Que posso eu fazer?”. Depois de um balançar de cabeça, que indicava reprovação, o velho pegou sua bengala e, com certa dificuldade, se levantou do pequeno banco de madeira no qual estava confortavelmente sentado. Depois disso, andou até o muro. “Definitivamente ele é alto”, pensou o pequeno homem de cabelos brancos, pele enrugada e olhar penetrante. O jovem continuava parado, esperando para ver o que o velhinho iria fazer. Depois de um tempo de observação, o velho começou a tatear o muro, até que parou as duas mãos em um determinado ponto. Começou a empurrar. O jovem continuava parado. “Não vem aqui ajudar um idoso a empurrar o muro?”, bradou o homem, mostrando certa impaciência. Assustado, o jovem começou a andar na direção do velho, sem entender o que ele pretendia. “Vais empurrar o muro?”, perguntou o jovem, cético. “Claro que não. Acha que tenho força para tal? Não vês, bem em frente de ti, que há alguns tijolos soltos, que podem ser facilmente movidos por um braço forte?”. Depois de olhar alguns segundos, o jovem apontou para o muro, atônito, e disse: “Sim, agora vejo!”. “Então me ajuda! Vistes que não bastam braços fortes para empurrar o muro?”. “Como assim?”. “É preciso também coragem, o que não tens. Anda, empurra!”. Juntos, conseguiram empurrar os tijolos, que caíram no chão e abriram uma pequena passagem no muro. “Vem!”, ordenou o velho, passando pela pequena passagem que abriram. “E agora, o que vês à sua frente?”. “Nada” disse o jovem, estupefato. “Se soubesse disso”, continuou o jovem, “não teria desperdiçado forças para abrir este rombo na parede”. “Anda. Acompanha-me”. Andaram alguns passos, se afastando do muro, rumo ao caminho que não tinha nada. “Olha para trás. Que vês?”. “Vejo pegadas!”, disse o jovem, surpreso. “Elas estavam ali antes de passarmos?”, perguntou o velho. “Não, não estavam...Ai!”. “Que foi?”. “Pisei numa pedra!”. O velho simplesmente sorriu. “Porque sorri de meu ferimento e minha desgraça?”. “Havia alguma pedra por aqui quando olhamos lá de trás?”. “Não, não havia”. Andaram mais um pouco e encontraram um rio. “Bebe a água”, disse o velho. “Agora olha para trás. Que vês?”. “Vejo pedras, um rio e pegadas”. “Exatamente. Esse era o caminho que você, lá atrás, disse não ter visto nada. Agora, se me permite, vou ficar por aqui. Já andei demais e minhas pernas estão cansadas. Agora vai! Anda e constrói o teu caminho. À frente nunca vai haver nada enquanto não andares, até que a ‘frente’ se torne ‘trás’. Logo, não existe ‘frente’ e não existe ‘trás’. Existe o caminho andando e o caminho por andar. Anda logo, não suporto mais ver-te parado diante de mim. Quero descansar. Vai e toma teu rumo!”. O jovem olhou para frente e, como antes, não viu nada. Mas dessa vez ele sabia que tinha que andar. E andou.

Rafael de Paula